A digitalização e o ecommerce são dois dos factores que têm conduzido a uma mudança de paradigma e a uma consequente transformação da operação postal. Nos últimos 12 anos, os CTT registaram um decréscimo de 43% no envio de cartas, com a entrega de menos 563 milhões, enquanto o volume das encomendas disparou com um aumento substancial de 98%, representando mais 8 milhões de pacotes postais.
Em simultâneo, verificou-se um forte desenvolvimento das infraestruturas rodoviárias, o que permitiu a exploração de soluções mais otimizadas na definição das rotas operacionais. Paralelamente a esta evolução, o modelo produtivo dos CTT tem sofrido várias transformações, tendo como principal driver de atuação o aumento da eficiência operacional.
Perante este cenário e condições favoráveis, os CTT procederam à implementação do projeto NARPEL – Nova Arquitetura da Rede de Produção e Logística, que teve como principal objetivo a construção de uma nova rede de operações, com um novo e otimizado modelo de produção e logística, alteração de localização de nós, desenho de novas rotas e circuitos e transferência de atividade entre os nós da rede.
Segundo Alexandre Silva, responsável pela organização e desenvolvimento das operações (Produção, Logística e Distribuição) dos CTT, «este projeto decorreu dos investimentos que a empresa tem vindo a realizar, nos últimos anos, nomeadamente ao nível da centralização dos dados de informação e da georeferenciação, através da colocação de GPS na frota e da identificação de todas as portas do país com a respetiva coordenada, o que nos permitiu desenvolver modelos logísticos de forma diferente que até agora não era possível porque não tínhamos a tecnologia ao nosso dispor». A par disto criou-se uma equipa de trabalho transversal que desenvolveu dois algoritmos de otimização de processos próprios.
Importância da evolução das infraestruturas
A evolução das infraestruturas rodoviárias do país foi também um trunfo, do qual «a nossa organização não estava a tirar total proveito.» É o exemplo da abertura do túnel do Marão que permitiu fechar e deslocalizar o centro de Vila Real para Mirandela, onde foi criado um novo centro logístico para servir todo o nordeste transmontano. Isto porque, «o túnel do Marão permitiu aproximar Vila Real do Porto e deslocalizar o nosso centro mais para o interior do país», refere Paulo Alexandre Silva.
Antes da implementação do NARPEL, os CTT detinham 3 grandes centros de produção e logística. com a análise que foi feita à rede de logística e de produção, a atividade que existia em Coimbra, vocacionada para o correio, foi transferida para os centros de produção do Porto e de Lisboa. Coimbra passou a deter serviços de desmaterialização e digitalização, de documentos. Paulo Alexandre Silva explica que «esta deslocalização da atividade de correio associada à reorganização da rede permitiu-nos, neste momento, estar a trabalhar em exclusivo com dois centros de produção que servem todo o país».
O grande desafio para a empresa, de acordo com Paulo Alexandre Silva é que «durante 30 anos esteve quase sempre na mesma rede, com ligeiras otimizações e após o investimento em infraestruturas digitais, tecnologias e desenvolvimento de outros modelos permite-nos agora anualmente estar a adaptar a nossa rede logística às alterações não só das matrizes de origem do destino dos objetos, sejam do correio, mas principalmente do expresso que é o que está a ganhar maior peso. Também temos agora uma solução de carga, graças à aquisição de uma empresa no ano passado, pelo que estamos a integrar todas as redes o que traz novos desafios à rede logística. Estamos a falar de paletes em peso, pelo que falamos numa lógica mais B2B. O que pretendemos é a rentabilização das nossas plataformas, o que vai ao encontro da estratégia da empresa que é alargar o seu portfólio em termos de serviços e soluções.»
De salientar que desde a implementação do NARPEL já foi feito um upgrade ao projeto, «de fácil conceção e operacionalização, uma vez que as condições já estavam criadas». Foram desenvolvidas novas plataformas intermédias para fazer atividade de cross docking. «O que fizemos foi aproximar a descentralização das nossas ligações mais próximas do destino. Por exemplo, antigamente as viaturas saiam já carregadas para a zona de Torres Novas. Agora fazemos as ligações de camiões pesados até Torres Novas e depois, a partir de um modelo em estrela, servimos os nossos centros de distribuição postal. Ao aproximarmos essas tarefas de cross docking e desconsolidação mais perto do destino permite-nos um ganho evidente ao longo da cadeia, porque consolidamos mais na origem e desconsolidamos mais próximo do destino», continua o responsável.
Com este upgrade criaram-se mais plataformas intermédias em Aveiro e Braga, com recurso a infraestruturas já existentes no grupo CTT o que permitiu continuar a reduzir nos Km, na emissão de CO2 e aumentar os níveis de poupanças. Desde o ano passado, os CTT contam na sua organização logística com mais cinco plataformas intermédias novas. As vantagens são claras: «estar mais próximo do cliente e ter outro nível de serventia, não só ao nível de eficiência, mas também de qualidade e capacidade de resposta».
Inovação dos serviços
Atualmente, os CTT estão a diversificar o portfólio com soluções de serviço, que muitas vezes já não tem a ver com a entrega da carta ou do pacote. As novas competências de Coimbra levaram a uma maior aposta nos serviços de desmaterialização e de digitalização, de documentos. Há empresas que só recebem documentos em formato digital. «São serviços destes de desmaterialização e digitalização de documentos que nos torna mais eficientes na cadeia de valor do correio e que nos permite libertar potencial para podermos desenvolver outro tipo de serviços».
A capilaridade dos CTT permite que os carteiros para além dos serviços postais normais e de encomendas, realizem também serviços de proximidade junto da população e até de serviços como leitura de contadores, entre outros. A implementação do NARPEL permitiu, através de uma rede logística mais otimizada, criar respostas para as diversas necessidades dos clientes, nomeadamente ao nível do ecommerce onde a rapidez na entrega e a comodidade são fatores decisivos. É o exemplo da distribuição no dia seguinte, com entregas em locais próprios onde os clientes querem passar e recolher a encomenda e da colocação de packstations, que estão em fase de teste e cujo alargamento depende da aderência dos clientes. Ou também dos primeiros passos da entrega same day, um serviço de hoje para hoje, que será o futuro ao nível da distribuição, principalmente ao nível dos grandes centros, entre outros.
Também o lado da mobilidade está a evoluir. É cada vez mais raro ver carteiros apeados, tirando no centro de Lisboa e Porto. A tendência é que todos venham a ter veículo, pelo que já está a ser implementada uma solução elétrica de fácil condução (três rodas), com capacidade de carga e que possa passar por todas as estradas das cidades. «Já existem câmaras municipais que impedem a circulação dos carros de combustão, pelo que estamos a fazer a eletrificação da nossa frota. A mobilidade urbana é uma das nossas maiores preocupações neste momento e, por isso, estamos a desenvolver com uma startup um veículo totalmente feito em Portugal e adaptado às nossas necessidades de logística urbana», refere Paulo Alexandre Silva, adiantando que os mesmos deverão ser colocados em circulação em Lisboa, Porto, Aveiro e Évora, entre setembro e outubro próximos.
Processo de otimização é para continuar
Mas o processo de otimização não fica por aqui e os CTT continuam a dar cartas em termos de inovação. É exemplo disso, a solução desenvolvida em Cabo Ruivo com recurso a AGV e braços robotizados, «o que já nos deu a conhecer nos EUA, através de artigos publicados, como uma empresa relevante da robotização do mundo postal», diz Paulo Alexandre Silva. «Apesar da nossa dimensão, ao nível da qualidade e serviço e da inovação tecnológica e de processos estamos a chegar ao pelotão da frente».
Nesta solução, as paletes são levadas por três AGV e colocadas por um braço robotizado no tapete. Quando a palete está vazia os AGV vão buscá-las e arrumá-las na zona de material vazio. O objetivo é automatizar atividades pesadas e atribuir aos funcionários tarefas de valor acrescentado.
Apesar das mudanças operacionais, é certo que a «queda está a ser muito acentuada» ao nível dos serviços postais, pelo que nos próximos dois anos e meio, em 2020, a empresa vai fazer um programa de transformação profunda das operações. «Vai passar por adaptar a nossa organização não só à realidade atual, mas à realidade dos próximos anos. Temos de ser bastante mais eficientes e competitivos, porque só reorganizando totalmente a forma como operacionalmente estamos organizados é que conseguimos chegar lá. Mantendo a capilaridade e indo às ruas dos portugueses todos os dias. É um desafio acrescido, mas é o que nos diferencia das outras organizações», conclui Paulo Alexandre Silva.
Artigo completo na edição nº 167 da revista Logística Moderna