Os benefícios que as soluções 5G irão trazer ao setor da logística não se cingem à competitividade e inovação dos modelos operacionais, mas também ao seu contributo para a sustentabilidade das operações.
O 5G é uma tecnologia disruptiva, fundamental para a transição digital das empresas. Poucos serão os setores e áreas da economia e da sociedade que não serão tocados pelas possibilidades acrescidas desta tecnologia. Em entrevista à Logística Moderna Mário Seborro, Diretor Comercial da Altice Empresas, explicou as vantagens desta tecnologia para a cadeia de abastecimento ao nível da eficiência e visibilidade em real time das operações.
Logística Moderna – A Altice é uma das grandes empresas em Portugal a dominar as comunicações móveis. Qual é neste momento a disponibilidade real de tecnologia 5G em Portugal? A ideia é fornecer acesso a todos, independentemente de onde estejam e na promoção da coesão territorial. De que forma é que o 5G pode impulsionar a interioridade? O 5G pode alavancar uma “deslocalização” mais fácil para o interior?
Mário Seborro – O 5G é, de facto, uma nova tecnologia, uma tecnologia disruptiva, fundamental para a transição digital do país, mas tem de ser combinada com as infraestruturas de rede fixa, com a rede de fibra ótica. Foi por isso que, nestes últimos cinco anos, a Altice Portugal assegurou a cobertura com fibra ótica de praticamente todo o país. Mais de seis milhões de lares têm acesso à fibra ótica da Altice Portugal para garantir que, efetivamente, a combinação entre as redes fixas e as redes móveis levem a essa universalidade de acesso.
É nossa estratégia que esta tecnologia tem de ser uma tecnologia para Portugal e para os portugueses, e é sob este desígnio que o 5G da Altice Portugal já está disponível de norte a sul do País, em todas as capitais de distrito e ilhas.
Quais são as vantagens do 5G na transformação digital das empresas industriais, de logística e de transporte de mercadorias (ao nível da velocidade de resposta, transferência de dados, etc.)? Há uma estratégia para a transformação dos setores verticais estruturantes da economia? Qual o impacto esperado nos vários setores?
A produtividade e inovação empresariais têm beneficiado do desenvolvimento tecnológico ao longo das décadas, e o 5G será disso um exemplo por excelência, como peça que faltava na transformação digital das empresas com novos horizontes. Poucos serão os setores e áreas da economia e da sociedade que não serão tocados pelas possibilidades acrescidas do 5G.
A re-industrialização europeia só será competitiva em termos mundiais se adotar o modelo de fábrica digital, flexível na sua reformulação ao longo do ciclo de vida, e conectada ao seu ecossistema. Os sistemas de saúde e educação podem implementar com maior facilidade os novos paradigmas híbridos de futuro, mais descentralizados, com valências físicas e virtuais e com a centralidade no utente (paciente e estudante). Os sistemas de transporte estão a iniciar a transformação, não só em termos rodoviários, onde se centram as atenções mediáticas na condução assistida e veículos autónomos, mas também no conceito de smart port.
De igual forma na área de logística, a cadeia de abastecimento e distribuição poderão ambicionar operações mais eficientes, com visibilidade em real time das operações e com capacidade de partilhar com maior visibilidade, de montante a jusante, o estado/localização de cada item da cadeia.
Recursos humanos
devem ser parte da equação
No que diz respeito aos Recursos Humanos espera-se que estes projetos possam trazer redução de mão-de-obra ou apenas ganhos de produtividade que vão permitir às empresas crescer, tornar-se mais fortes e resistentes à concorrência?
Os projetos empresariais suportados em 5G, devem responder aos objetivos das empresas, nomeadamente como ferramenta da jornada de Transformação Digital que pretenda desenvolver.
As questões relativas aos recursos humanos devem ser parte da equação na evolução do negócio, seja na sua formação em novos processo e tecnologias, seja na recapacitação em processos impactados. Haverá casos de uso em que (i) a rentabilização de um colaborador especialista pode ser potenciada em várias intervenções remotas (sem deslocação) apoiadas por tecnologia 5G & AR/VR, que permitem ambientes imersivos muitos eficazes (ii) uma atividade hoje feita por um colaborador pode ser substituída por monitorização ou sensorialização (por exemplo vigilância via drone ou câmara), libertando recursos para atividades mais nobres.
As decisões quanto aos casos de usos e reformulação da estrutura e colaboradores das empresas farão parte da jornada de adoção de 5G de cada negócio.
Mudanças radicais nas tecnologias usadas, implicam que seja feito um esforço grande para dar formação às pessoas. Como é que isto funciona na prática?
Sendo um game changer e um projeto de transformação digital, o 5G deverá mexer com os alicerces do negócio e impactar os principais KPIs das empresas, quer internamente na sua operação, quer na relação com os clientes e parceiros.
A particularidade do 5G, é ser capaz de exponenciar outras tecnologias na disponibilização de uma solução completa end-to-end.
Neste contexto complexo, a formação às pessoas deve ser entendida como fator crítico, a par das tecnologias e processos. Haverá novas tecnologias a operar, processos reinventados que precisam do enquadramento e novas competências, e acima de tudo, uma cultura empresarial ágil e future driven que seja capaz de abraçar novos projetos de forma profissional.
Real time tracking,
automação e robótica/AGV
A utilização da tecnologia 5G, permite ter uma melhor visibilidade das operações, da intralogística e da supply chain? Está ligada a tecnologias IoT/IIoT? A sensorização permitida pela rede 5G, permite melhorar as intervenções preventivas?
O 5G deve ser entendido como um meio e não um fim em si mesmo. Mais do que um rodmap tecnológico onde o 5G pode com vantagens substituir outros protocolos de comunicação sem fios (e.g. wifi), a abordagem transformadora considera o 5G como uma peça exponenciadora de outras tecnologias existentes, numa solução completa ao serviço do negócio. Para cada um dos use cases, e para a obtenção dos benefícios finais, ao 5G são agregadas outras componentes da solução como IoT, Cloud, ciber segurança, aplicações e algoritmos, que entregam as funcionalidades esperadas ao negócio.
Nesse sentido, sem dúvida que a integração entre 5G e IoT é central na entrega de inúmeras soluções. A tecnologia 5G pode desde logo potenciar uma maior densidade de devices IoT conectados por área geográfica, quando comparada com a rede anterior. Adicionalmente, permite soluções de localização de ativos e dispositivos mais fina e precisa.
Neste contexto de visibilidade e capacidade de decisão e intervenção preventivas, destaque para soluções de gémeo digital que simplificam a tomada de decisão pela gestão da cadeia de abastecimento, dando a conhecer a sua performance, e ajudando a simular novas realidades de operação.
Paralelamente, e por via da sensorização fina das operações com colocação de dispositivos IoT conectados à rede 5G, pode ser avaliado periodicamente o estado das operações, ou dispositivos e mercadorias em concreto, e dessa forma, atuar preventivamente e proactivamente com ganhos óbvios de operação.
As áreas de real time tracking, automação e robótica/Automated Guided Vehicule serão certamente fonte de inovação e benefícios para este sector.
Numa empresa Industrial ou de Logística, o que é possível fazer com o 5G, que não era possível com a tecnologia disponível até à data?
A utilização de 5G deve ser enquadrada numa agenda e roadmap de Transformação Digital das organizações. Nesse contexto, esta nova rede permite expandir as possibilidades do negócio em áreas transversais como o controlo de qualidade automático real time, a localização precisa de ativos, a formação imersiva on the job, a manutenção apoiada por especialista, a segurança em locais perigosos, a automação de dispositivos ou o controlo de stock em real time, entre muitas outras.
Na realidade, as caraterísticas diferenciadoras da conectividade 5G, permitem soluções end-to-end que aportam informação em tempo quase real seja na operação, seja no suporte à decisão, e com isso permitem antecipar decisões e melhorar a eficiência dos processos.
«Os ganhos efetivos dependerão
dos use cases escolhidos»
Quais os ganhos de produtividade das operações logísticas graças à digitalização dos processos? Se falarmos em velocidade e quantidade de dados, que podem passar a ser processados, é possível quantificar esses ganhos?
Os ganhos efetivos dependerão dos use cases escolhidos por cada empresa, e pelas circunstâncias e potencial de evolução de cada organização em concreto. A Altice Empresas está apta, com a sua rede de parceiros, a poder realizar a jornada de discovery, Proof of Concept/Value e identificação de projetos mais promissores, que possam garantir o retorno de investimento mais apropriado.
Seria possível apresentar alguns case-studies em Portugal ou no estrangeiro? Ou seja, concretamente uma empresa instalando uma solução 5G vai conseguir fazer o quê?
O sector de logística e transporte tem sido objeto da atenção Altice Portugal sendo possível antever vários use cases 5G, dos quais vale a pena destacar (i) automação de dispositivos com mobilidade (e.g. AGVs) in/outdoor (ii) captação de streaming de câmaras de vídeo de elevada resolução, permitindo utilizações tão amplas como controlo de qualidade com algoritmos IA para monitorização de falhas face a padrões, deteção de intrusões em locais críticos, vigilância anti roubo e outros (iii) soluções de Mission Critical Push-to-X para comunicação e intervenção mais célere e articulada nas comunicações críticas de equipas de operações, em ambiente privado de voz, vídeo e chat.
Os pilotos/demos na tecnologia 5G são vários na Altice Portugal, desde a condução autónoma às comunicações críticas em contexto de acidentes.
A edição 2021 do IoT Challenge foi sintomática de um novo conjunto de projetos inovadores em áreas de aplicação 5G nas fases exploratórias como AGVs, drones, sensores conectáveis e real time vídeo analytics.
O papel do 5G
nos portos de mercadorias
A transformação digital dos Portos está em curso. Quais as mudanças que o 5G pode trazer ao setor e às operações dos Portos? O que poderá mudar na gestão portuária?
É manifestamente necessário perceber os processos e dinâmicas no porto, sem os quais nenhuma análise de negócio é sequer possível, e ninguém melhor que o cliente o pode fazer. Ciente da necessidade de know-how específico a cada setor e cliente, a Altice Empresas está a desenvolver um ecossistema de valências e soluções que pode permitir endereçar projetos de smart port, para dar resposta aos desafios que hoje estas infraestruturas enfrentam, para serem competitivas no mercado global.
As infraestruturas dos portos terão múltiplos casos de uso que conduzirão a tempos/custos de atracagem mais reduzidos, check-in automático de camiões/contentores/mercadorias e comunicação crítica de voz/vídeo entre entidades a operar na área. Por exemplo
⦁ a operação de gruas começa a ser assistida por streaming de vídeo HD e consequente analítica para se conseguir reduzir taxas de erro de empilhamento e operação e garantir a segurança de trabalhadores e equipamentos
⦁ As entregas de documentos navio/porto (ship-to-shore), nem sempre feitas por via eletrónica, parecem ser um possível caso de uso, em que soluções com drones, evidenciam valores por entrega com reduções até 90% de custos e aceleração fantástica de tempos (use case proto Singapura)
⦁ Redução de custos de materiais roubados em áreas portuárias por vigilância e alarmística associada
⦁ A manutenção de dispositivos no porto pode desempenhar também vantagens claras nos custos de equipamentos, que serão parcela relevante da atividade portuária
⦁ Os custos energéticos/emissões com veículos autónomos e rotas definidas são reduzidos de forma notória face ao modelo de veículos tradicionais
Benefícios para
operações mais sustentáveis
O serviço de Pós-venda tem uma importância cada vez maior nos vários negócios. O que é que o 5G pode aportar a esta área? E aos Contact Centers?
Uma das áreas com maior investimento das empresas em termos de utilização de 5G é a manutenção remota, apoiada por streaming de vídeo de alta resolução e soluções de AR/VR (óculos e aplicação). Com estas soluções, um técnico de pós-venda junto do cliente ou de um equipamento avariado pode (i) solicitar apoio remoto de um especialista (ii) receber instruções direcionadas num ambiente imersivo para a sua tarefa, e com isso garantir a resolução na primeira intervenção de incidentes mais complexos.
Adicionalmente, serviços de entrega ou devolução na cadeia logística podem beneficiar de real time tracking, face a soluções de localização desses ativos.
E, por fim, a sustentabilidade com destaque para a redução da pegada de carbono. O 5G na transição digital e ecológica do setor dos transportes e da logística e na cadeia logística. Terá o 5G um papel importante na concretização desta transição?
Os benefícios que as soluções 5G irão trazer não se cingem à competitividade e inovação dos modelos operacionais, sendo já notório um importante contributo para a sustentabilidade e operações. Desde logo porque do ponto de vista tecnológico, a nova tecnologia 5G traz uma maior eficiência na rede em termos de consumo de energia por processamento. Mas o contributo mais evidente do 5G na resposta à crise ambiental é em particular o nível de redução de emissões em múltiplos projetos. A título de exemplo, a automatização de veículos em operação de terminais em portos digitais aponta para redução de CO2 perto dos 10%.
Esta entrevista foi publicada na edição nº 185 da revista Logística Moderna