VER OS CHINOS POR UM “CANUDO”

Actualmente, a verdade verdadinha, já não é só “braga” que se vê por um canudo, ou irá continuar a ser?, ou seja será que a fábrica do mundo esta doente e moribunda?
Honestamente, nunca acreditei muito naquela teoria de que é agora que vamos começar a produzir tudo mais perto do consumo. Começou a chamar-se nearshoring. Mas nearshoring é basicamente quando uma organização decide transferir o trabalho para empresas mais económicas e geograficamente mais próximas. Ora fomos nós que “transferimos” toda a produção para o oriente, e todos acreditámos que seria uma excelente ideia. O ocidente consumia, o Oriente produzia e éramos todos muito mais felizes. Uns produziam a preços miseráveis e os outros compravam a preços baratos. Assim foi durante muitos anos e as coisas até pareciam funcionar.
Eis que senão também veio da ásia um “bichito” que nos colocou todos em casa a consumir muito menos. Os transportes pararam. As pessoas não trabalhavam e as portas giratórias do dinheiro sofreram com a paragem dos motores. Ao invés, inovadoras soluções tecnológicas, o teams, o zoom e outros, presentearam-nos com a possibilidade de reunir on line, trabalhar on line, decidir on line, comprar on line e a nossa vida ficou muito mais on line.
Entretanto os “motores” lá voltaram a trabalhar, os aviões a voar, os navios a navegar, os camiões a andar e os comboios a circular e as pessoas a comprar.
Os preços do transporte subiram escandalosamente, mas a nossa ânsia de comprar não travava e é por isso, julgo eu, que surge a fabulástica ideia de voltar a trazer para mais perto do consumo a produção. O problema é que os “chinos” não estão propriamente a dormir e recentemente já vieram dizer que os seus objectivos de crescimento voltaram a ser o que era. Logo acabaram com a política 0 da covid, logo deram reinício á sua normalidade, ou seja produzir para o ocidente consumir. Não será fácil transferir a produção para mais perto e mesmo que aconteça demorará anos e eventualmente não deixarão de ser os mesmos a fazê-lo, ainda que mais longe de casa (deles), mas mais perto da loja, que vende.
Sempre referi que um dos meus maiores receios seria o que viria a seguir. Tínhamos assistido a uma pandemia mundial e resistimos. Em seguida uma guerra, que ainda continua e atrevi-me a vaticinar uma crise social. Ela aí está. Ora esta crise social que retira poder de compra, leva-nos novamente ao princípio, ou seja, comprar barato. As taxas de juro, a inflação, a especulação, a ambição e as dificuldades do dia a dia levam as pessoas a procurar o mais barato. Os transportes voltaram a preços pré-covid, mas os preços dos produtos não. O consumo vai-se retrair, mas há sinais que nos dizem que cada vez mais se vendem produtos de gama alta, o que significa que há mercados que não deverão ser muito afectados. Acredito que estes produtos tenham mais condições para transferir a sua produção para mais perto do consumo. Ou seja, produtos de gama alta.
É nesta gama que penso que Portugal tem excelente condições para proporcionar contextos mais favoráveis a esses investidores. Até há bem pouco tempo as grandes de marcas (roupa) produziam em Portugal. Somos um país seguro, com legislação laboral favorável, com preços de mão de obra acessíveis e com gente trabalhadora. Precisamos mesmo é de rever os processos burocráticos, o peso da justiça nas decisões, da energia e rever a política de taxas e taxinhas que se aplicam às empresas, empresários e pessoas e no nosso caso muito particular, de políticas que sustentem melhores cadeias logísticas, melhores acessibilidade, mais flexibilidade de todos os agentes que intervêm na economia, sejam públicos ou privados. Falo especificamente das entidades fiscalizadoras e reguladoras que terão de se adaptar à velocidade que o mundo hoje pula e avança, e perceber que as economias atuais vivem e funcionam 24h/dia e não apenas das 9h00 às 18h00.
Pelo meio, destas convulsões que não se tratam apenas com uma “mézinha”, surgem ainda as pressões ambientais e necessidade de descarbonização. A sustentabilidade ambiental é premente. O Fit for 55 lançada pela EU com o objetivo de tornar as políticas em matéria de clima, energia, uso do solo, transportes e fiscalidade apta para alcançar uma redução das emissões líquidas de gases com efeito de estufa de, pelo menos, 55 % até 2030 tem de ser considerada e equilibrada com a sustentabilidade social e económica.
Foi uma Caravela quinhentista que nos deu a esperança de um mundo global, apenas com energia sustentável, mas o mundo mudou. Será que o global se vai tronar mais local?
Este é outro imbróglio com que nos deparamos. Como vamos fazer para alterar os combustíveis utilizados? que combustíveis vamos utilizar? vamos ter cadeias logísticas mais curtas versus longas? Tenderão as economias a (des)globalizar?
Pois….
Acho que ninguém ainda sabe bem o que vai acontecer. Nesta equação temos ainda de considerar pessoas mais digitais, conhecedores, escrutinadores, informadas e preocupadas em conhecer a vida do planeta e o seu (pessoa) próprio ciclo de vida, que pretende que seja confortável, prazeroso, alegre e saudável, muitas vezes sem pensar na origem das coisas, das ideias, das decisões e de quem as produz.
O mundo só pula e avança porque o homem sonha e é o sonho que comanda a vida, e 2030 é já “amanha”, mas este sonho será realizável em 7 anos?.
Estamos perante o imbróglio é perfeito.

 

António Nabo Martins
Presidente Executivo APAT

Written by