Com o aparecimento de notícias animadoras sobre a disponibilidade até ao fim do ano de vacinas para a COVID-19, o único factor que pode por fim à pandemia e permitir que a vida volte ao normal, começam a colocar-se problemas de ordem prática, muitos destes que vão ter de ser resolvidos pelo sector da logística.
O primeiro problema é que a vacina da Pfizer e BioNTech tem de ser conservada a temperaturas aproximadas dos -80 graus celsius. A da Moderna é menos exigente, bastam -20 graus Celsius. Já a da AstraZeneca e Universidade de Oxford, basta ser mantida em frio positivo, não necessita de ser congelada.
O problema é que como já foi referido por vários especialistas não basta ter uma vacina, pois como acontece com muitos medicamentos para uma mesma patologia, um funciona bem com umas pessoas, mas mal com outras. Assim, o mais provável é todos termos de ter acesso a várias vacinas.
Agora uma cadeia de frio contínua com temperaturas do Polo Sul no pico do inverno não é fácil de conseguir. Claro que há cadeias para essas temperaturas, não estão é disseminadas por todo o lado. Por exemplo, quantas farmácias e centros de saúde em Portugal têm capacidade de armazenamento, mesmo pequeno, para estas temperaturas. Pior, mesmo nos casos em que existem, isso verifica-se mais entre centros logísticos, sendo a distribuição capilar mais problemática. Por outro lado, temos de pensar que no mundo desenvolvido tal até será possível, mas e em relação ao terceiro mundo?
A segunda questão é que embora seja possível e até haja soluções, estas não existem na escala que é necessária.
Problemas práticos
Não há armazéns suficientes, há alguns que foram preparados para a possibilidade de um surto de H1N1, que na realidade nunca atingiu uma dimensão pandémica.
Os principais operadores logísticos a nível mundial já têm e estão a trabalhar nas infraestruturas. A UPS tem, por exemplo, aquilo a que chamam quintas de congeladores. Face à dificuldade e ao preço alto que pressupõe construir de raiz armazéns de frio, está a optar por colocar milhares de congeladores industriais dentro de armazéns convencionais. Um destes está localizado em Louisville, no Kentucky, o principal hub nos EUA. Outro está, neste momento, a ser construído nos Países Baixos (Holanda). A ideia é ter dentro de um armazém filas de Stirling Ultracold freezers, com cada unidade a armazenar 48.000 frascos de vidro. A FedEx, por sua vez já declarou que está a duplicar a sua capacidade de armazenagem e a instalar congeladores que possam manter temperaturas de até -80 graus celsius em cidades como Memphis, Indianapolis e Paris.
Mas não basta armazenar é necessário transportar as vacinas. Para tal por exemplo, a FedEX já negociou com a Federal Aviation Administration, uma autorização para poder transportar mais gelo seco a bordo dos aviões. O gelo seco quando derrete emite dióxido de carbono o que é perigoso para as equipas de voo.
O problema é que um dos efeitos secundários da pandemia é uma escassez de gelo seco. O gelo seco é feito de dióxido de carbono, que é um sub-produto do etanol. Com a pandemia e o facto das pessoas se deslocarem menos este não tem tido tanta procura, logo não são produzidas as mesmas quantidades.
No verão, por exemplo, a empresa norte-americana Acme Dry Ice, baseada em Cambridge, Massachusetts, que fornece gelo seco à indústria da saúde, viu-se na necessidade de racionar o fornecimento. Mas segundo informações do sector este problema está a melhorar. O sector da logística pensa um pouco em tudo e a UPS, já começou a instalar máquinas para produzir gelo seco em alguns armazéns e a FedEX está a equacionar fazer o mesmo.
A Pfizer também já desenhou uma caixa do tamanho de um frigorífico para transportar a sua vacina. Estas têm capacidade para armazenar duas centenas de frascos de vidro, cada um com 10 a 20 dozes. Estas caixas estão equipadas com sensores de temperatura ligados a GPS, o que permite à Pfizer saber onde as caixas estão e avisar os responsáveis que deve acrescentar mais gelo seco.
Outro problema é o vidro. O vidro quando é sujeito a temperaturas muito baixas racha. Fabricantes de vidro fornecedores da indústria farmacêutica, têm receio que possa não haver vidro suficiente. Pelo menos um fabricante norte-americano, já recebeu ajudas (204 milhões de dólares) do governo federal para quadruplicar a produção de vidro apropriado.
Por fim, não nos podemos esquecer que é necessário dar formação a muitas pessoas para saberem lidar com temperaturas tão baixas. É também necessário disponibilizar equipamentos de protecção pessoal, como luvas, para evitar acidente graves.
A conclusão é que apesar dos problemas, estes parecem ter solução, produzir mais gelo seco, mas vidro que consiga aguentar temperaturas tão baixas, aumentar a capacidade de armazenagem, criar condições às farmácias ou centros de saúde para poderem ter caixas como as desenhadas pela Pfizer para armazenar a vacina. O resto terá de ser feito pelo sector da logística, que por estar habituado a que há sempre algo que corre mal, tenta antecipar-se e resolver os problemas.