Em Março já é possível fazer um balanço de como Fevereiro correu e as notícias não são animadoras. Fevereiro de 2020 vai ser recordado como o mês em que se começou a verificar uma possível disrupção histórica nas supply chains em todo o mundo, à medida que o coronavírus infligia danos ao comércio global. Foram canceladas várias viagens marítimas da China para a Europa e EUA, o que afecta todos os elos da cadeia logística.
Tal acontece porque 90% do comércio global é feito por via marítima, e a China é um país incontornável nesta cadeia. Assim, enquanto fabricantes de brinquedos, ou grandes marcas de moda como Michael Kors, Versage e a Jimmy Choo, enfrentam problemas nas suas cadeias de abastecimento, há navios parados. Quem exporta para a China também enfrenta problemas, pois empresas chinesas, invocando as clausulas de força maior têm-se recusado a cumprir os contratos, e recusam as cargas. Com os consumidores chineses retidos em casa, as fábricas fechadas, as necessidades de commodities como o petróleo ou gás já não são necessárias nas mesmas quantidades.
Os navios porta contentores que movimentam milhões de dólares de produtos numa única viagem vivem tempos complicados. O número de blank sailings (navios que não carregam num local planeado) tem aumentado. A AP Moller-Maersk A/S o maior armador a nível mundial, listou pelo menos 27 blank sailings desde 31 de Janeiro.
Há cerca de 600.000 contentores de 20 pés parados, como consequência do surto, segundo Alan Murphy, da Sea Intelligence. Para se perceber o ritmo, o número era de metade há uma semana antes. Embora estes números possam variar, se pensarmos que o valor de um contentor é de 1.000 dólares, tal significa que os armadores tiveram de aceitar um impacto de 600 milhões numa semana. Os navios provavelmente vão reduzir a velocidade (slow steaming) na expectativa que as coisas melhorem nas próximas semanas. Há também outro efeito. Se os contentores usados pela Europa e EUA para as suas exportações não saírem da China, isto acabará por provocar uma falta de contentores nos outros mercados.
Efectivamente, o surto começa a afectar todos os sectores. A energia e as commodities não são excepção. Produtores de petróleo em África, América Latina e Mar do Norte declararam, inicialmente, haver menos procura por parte da China. Enquanto isto, clientes do petróleo Saudita pediram para reduzir as entregas no mês de Março.
No mercado do gás, uma empresa chinesa declarou força maior, o que significa que provavelmente pode não cumprir os contratos. Embora tal tenha sido rejeitado pela Total e Royal Dutch Shell o resultado é que neste momento estão 12 navios de transporte de gás parados na costa do Qatar, um dos maiores produtores mundiais. E, embora, não seja possível ter a certeza de que a razão seja a redução de compras, o certo há navios a serem redireccionados, cancelamentos de cargas e uma redução da procura na Ásia desde o início do surto. Muitos petroleiros encontram-se parados ao largo da China.