Na generalidade dos sectores de atividade, os líderes atuam num ambiente em permanente evolução, que os confronta constantemente com cada vez mais “problemas sem dono” – aqueles que, por não terem sido previstos, não se enquadram nas atribuições de nenhuma função ou departamento.
As organizações convencionais, estruturadas por áreas funcionais, com delimitações precisas de responsabilidade, não estão equipadas para lidar com este tipo de problemas. O princípio de especialização que as norteia leva a que quem trabalhe numa área apenas tenha uma noção muito vaga do que se passa nas outras, e a visão de conjunto fica reservada ao escalão mais elevado da hierarquia.
Quando estes “problemas sem dono” surgem, a reação normal dos líderes de departamento ou secção é “isto não é comigo”. É uma reação expectável, pois foram treinados a focar-se na sua (habitualmente exígua) área de responsabilidade e a “não meter o nariz onde não são chamados”. Por sua vez a alta hierarquia, em princípio mais livre destas peias, costuma estar demasiado longe da “linha de frente” para se aperceber destes problemas em tempo útil e reagir apropriadamente.
O resultado, como é bom de ver, é desastroso: os problemas mais importantes – aqueles que têm origem na mudança e que por isso mesmo ninguém sabia antes como resolver – continuam sem dono… e a criar uma devastação que tende a permanecer desapercebida.
O que faz falta – e que as organizações mais bem sucedidas procuram incentivar – é justamente a atitude contrária, a “compra” proativa dos “problemas sem dono” por parte daqueles que em primeiro lugar os detetam, aquilo a que em linguagem coloquial chamamos “chegar-se à frente”. Mesmo se para isso tiverem de pôr de parte os outros problemas de que já são “donos”? Em abstrato, sim. Por definição, os “problemas sem dono” constituem uma ameaça maior e mais urgente, e os que já têm dono são sempre passíveis de delegação.
Isto leva-nos a uma qualidade que prima pela raridade nas organizações burocráticas mas que muitos autores consideram um atributo fundamental da liderança eficaz: a iniciativa.
Um estudo recente da Zenger & Folkman, um gabinete de pesquisa norte-americano especializado na análise estatística do comportamento organizacional, mostra que a propensão para tomar iniciativa tem de facto um impacto substancial na eficácia geral do líder, e que é um poderoso preditor dessa eficácia nos líderes mais jovens, isto é, em início de carreira. O mesmo estudo revela uma robusta correlação entre a iniciativa do líder e o comprometimento (engagement), o esforço discricionário e a retenção dos seus colaboradores – todos eles fatores da maior importância para o êxito da organização. Significativamente, o estudo mostra ainda que as mulheres têm maior propensão para a iniciativa do que os seus colegas do sexo masculino.
Em muitos casos, os líderes que se abstêm de tomar a iniciativa não o fazem por comodismo; limitam-se a seguir as normas de uma cultura organizacional que lhes sussurra ao ouvido: “na dúvida, é melhor ficares quieto, senão ainda sobra para ti”. É esta cultura que é urgente combater e reformar, se quisermos organizações adaptáveis e ágeis a responder às solicitações e dos desafios que o ambiente de negócio constantemente lhes faz.
Mudar uma cultura não é fácil, mas é possível. Exige uma ação concertada em duas frentes: por um lado, criar a fortalecer os fatores que fomentam a iniciativa, e por outro remover os obstáculos que a travam. Entre os primeiros, o mais importante é aprender a ver a organização como um todo, o “porquê” da sua existência; não é preciso usar expressões grandiloquentes como “visão estratégica”, basta entender o que os clientes esperam e o contributo que cada departamento, cada equipa dá para o cumprimento dessas expectativas. A seguir, atribuir a todos os líderes, em qualquer nível, autoridade para atuar perente um problema imprevisto partindo daquele entendimento e usando o bom senso.
Não basta porém criar os estímulos, é preciso remover os obstáculos. É preciso deitar abaixo os “silos organizacionais”, as fronteiras rígidas entre departamentos que impedem as pessoas de falar umas com as outras e de se alertarem mutuamente… porque os diretores “não gostam de ser ultrapassados”! E acima de tudo, criar um clima de segurança psicológica, em que ninguém se receie sofrer represálias por ter tomado uma iniciativa e não ter tido êxito.
João Paulo Feijoo