Uma supply chain é definida como uma rede orientada por objectivos de processos e pontos de stock usados para fornecer bens e serviços aos clientes. O principal objectivo da rede é atender aos pedidos dos clientes de forma lucrativa, ou seja, fazer as transformações necessárias nas matérias-primas, no uso de recursos e energia para entregar o acordado.
No nosso trabalho com executivos e empresas de todo o mundo, continuamos a constatar que as organizações ainda estão na fase inicial, no que toca à transformação das suas cadeias de abastecimento. Em particular, a evolução de um modelo tradicional para uma cadeia de abastecimento conectada, vai exigir que as empresas aproveitem ao máximo a interacção entre os comportamentos do cliente, as capacidades cognitivas e a gestão da rede. As cadeias de abastecimento que estão presas na era pré-conectada são pouco mais do que uma série de segmentos estanques compostas pelo marketing, desenvolvimento de produto, procurement, produção e distribuição – até que chega finalmente às mãos dos clientes. Não há um sentido real de ecossistema colaborativo. Como resultado, uma empresa tem capacidade limitada de antecipar ou responder a disrupções, seja decorrente da mudança de hábitos dos clientes ou de novos concorrentes.
De todas as inovações tecnológicas da chamada quarta revolução industrial, a Inteligência Artificial (IA) ou tecnologias cognitivas empregam capacidades previamente atribuídas ou realizadas por seres humanos, como conhecimento, informação ou percepção, para resolver problemas complexos de gestão, como os mencionados acima. O progresso feito recentemente na capacidade de processamento, no desenvolvimento de algoritmos e em machine learning pode levar essas actividades ao próximo nível em abrangência e profundidade. Em particular, a IA abrange quatro técnicas básicas que as empresas podem usar para extrair informações dos seus dados.
i) Machine Learning Estatístico, usado para automatizar processos de tratamento de dados e ajustar modelos aos dados
ii) Redes neurais, que usam “neurónios” ou nós, artificiais para ponderar as entradas e relacioná-las às saídas
iii) Deep Learning, que utiliza redes neurais com muitas camadas de variáveis ou características para, por exemplo, extrair significado de um texto ou fornecer reconhecimento de imagem e voz
iv) Rule based expert – sistemas, usados para definir regras lógicas derivadas de especialistas humanos, visando substituir tarefas regulares ou recorrentes
Estas técnicas e a sua combinação podem proporcionar uma melhoria significativa na transformação de grandes partes da cadeia de abastecimento, e mais importante, na remoção de barreiras e na criação de uma visão end-to-end das operações globais das empresas. Vemos organizações líderes a usar diferentes técnicas de IA nas seguintes áreas de negócios:
• Previsão da procura: a combinação de dados internos e externos (evolução dos preços das matérias-primas, comportamento dos concorrentes e do cliente, efeito de promoções, clima, etc.), pode ser usada para produzir modelos de previsão melhorados usando machine learning, o que originará previsões de vendas melhores, do que as estimativas humanas. Enquanto as previsões melhorarem, a confiança propagar-se-á às outras áreas de negócios, optimizando a cadeia de abastecimento.
• Sourcing e gestão de inventário: decisões sobre o que comprar e para quem, agora podem ser tomadas por máquinas, que incorporam o desempenho histórico e a qualidade de entrega do fornecedor e atribuem pedidos directamente com base no desempenho dinâmico da rede de abastecimento.
• Scheduling optimization: o que produzir e quando, quando escalar para cima/para baixo são algumas das decisões complexas e recorrentes, que qualquer empresa envolvida na produção precisa tomar. Melhores previsões de procura, com datas de entrega mais precisas do fornecedor, podem ser usadas para optimizar o planeamento da produção com base nos estrangulamentos e desempenho esperados.
• Optimização da produção: eventos não planeados podem interromper a produção e causar perdas significativas no trabalho em progresso e nos recursos operacionais. Os modelos de machine learning podem prever quando é mais provável que ocorram e minimizar a ocorrência.
• Manutenção preditiva: à medida que mais equipamentos e máquinas são conectados, algoritmos avançados podem ser usados para decidir quando é o melhor momento para a manutenção de equipamentos críticos, com base na procura, desempenho e utilização do chão de fábrica.
• Transporte e logística (outbound): a optimização de rotas para melhorar o custo das entregas é uma área de especial relevância para as técnicas de optimização e de IA.
As tecnologias tradicionais que apenas há alguns anos poderiam ser consideradas revolucionárias para prever níveis de inventário e evitar falta de stock, estão a ser substituídas por sistemas de machine learning, que podem monitorizar continuamente as vendas, o clima e a resposta às promoções de marketing, para ajustar as cadeias de abastecimento. As empresas de logística, por exemplo, estão a eliminar rotas regulares fixas alterando para rotas dinâmicas, que são adaptadas em tempo real com base no tráfego, condições climatéricas ou outras condições externas. Essas capacidades cognitivas estão completamente fora do alcance do planeador mais experiente.
As cadeias de abastecimento baseadas em IA poderão optimizar qualquer número de factores para todas as suas variações possíveis. Com dados suficientes, o modelo baseado na análise pode produzir um cenário de custo mínimo, mostrando quanto dinheiro potencialmente pode ser economizado e como atingir esse objectivo, ao mesmo tempo que mitiga os riscos. Por fim, a análise prescritiva poderá oferecer cenários com um nível de detalhe muito fino, descrevendo como a mudança para um novo fornecedor pode afectar a qualidade do produto, ou mesmo se a introdução de um novo tipo de veículo autónomo aumentaria a segurança no piso do armazém.
No nosso relatório mais recente, AI-powered supply chains: Making your supply chain bionic, exploramos o processo para continuar a avançar nas oportunidades que a IA traz para melhorar as cadeias de abastecimento e fornecemos algumas etapas simples para dar início a essa transformação, a saber:
1. Pergunte a si próprio o que sabe sobre o comportamento dos seus clientes (ou dos clientes finais no seu sector). Faz captura de dados, analisa-os e cria modelos de como a situação pode mudar? Se não, por que não?
2. O que é que pode automatizar usando IA e advanced analytics? Como é que pode usar sistemas que respondem em tempo real para oferecer aos clientes serviços mais rápidos, melhores produtos e uma experiência mais poderosa? Como é que pode treinar os seus funcionários nessas técnicas, para acrescentar valor ao trabalho deles?
3. Como é que pode construir uma rede complexa e eficaz? Essa rede permite a gestão dos seus clientes e o uso profundo do seu conhecimento sobre o comportamento deles, fornecendo serviços de outras empresas existentes no seu ecossistema, integrados nos seus de forma a atender às necessidades dos seus clientes.
À medida que as empresas continuam a explorar e a experimentar as possibilidades que a IA permite, à melhoria das suas cadeias de abastecimento, estas tornar-se-ão mais cognitivas com o decorrer do tempo. Acreditamos que aqueles que investem constantemente e fazem uma boa ligação entre os seus problemas de negócio e as capacidades da IA estarão melhor preparados para tomar decisões ao longo das suas cadeias de valor e assim, ganharão relevância e competitividade num ambiente de negócios complexo e volátil.
Joaquín Blanco Díez
Director da PwC, Supply Chain and Operations, em Espanha
Este artigo foi publicado na revista Logística Moderna, edição de Setembro/Outubro de 2019