Organizações que aprendem.v2

Os leitores desta coluna já devem ter reparado na minha predileção por associar a liderança à aprendizagem. Esta preocupação com a aprendizagem tem uma razão de ser: vivemos um tempo de rapidíssima evolução, em que o mundo muda a uma velocidade estonteante e aquilo que conhecíamos e que sabíamos fazer ontem já pouco se aplica hoje e ficará totalmente ultrapassado amanhã.

Para acompanhar esta transformação é aprender constantemente. Quem se distrair ou desistir de aprender condena-se à exclusão, tanto profissional como pessoal. E as organizações que não querem ou não conseguem fazê-lo acabam por definhar e ser substituídas por outras mais ágeis e mais adaptáveis.

Tormar uma capaz de aprender é muito mais do que “dar formação” aos trabalhadores. Implica despertar neles a vontade – e a responsabilidade – de aprender por iniciativa própria e também, de caminho, de ensinar os colegas. As organizações que o fazem melhor partilham um conjunto de caraterísticas que apontam o caminho, e todas essas caraterísticas exigem convicção e ação decidida por parte dos líderes.

Em primeiro lugar, a sua cultura proporciona um ambiente favorável à aprendizagem. Uma condição indispensável é a segurança psicológica, que foi o tema desta coluna no número anterior; como se recordarão, “segurança psicológica” significa poder dizer aquilo que pensamos sem receio de ser punidos, de olhar para os erros como oportunidades de aprendizagem e não como motivo de punição (exceto, evidentemente, em caso de dolo ou negligência grosseira) e de discutir abertamente as suas causas e as formas de os evitar. Notem que “dizer aquilo que pensamos” significa poder discordar abertamente e desafiar a opinião até mesmo daqueles cujo estatuto nos é superior. Conhecem muitos sítios onde isto seja possível?

A segurança psicológica também é indispensável à experimentação e à inovação. As organizações mais inovadoras estimulam as experiências espontâneas por parte de todos os seus trabalhadores; ora, como cada inovação arrasta atrás de si uma longa cauda de experiências falhadas, é fundamental que aqueles saibam que tais insucessos não lhes serão “cobrados”… e que podem continuar a fazer experiências e a cometer erros!

Este ambiente privilegia a valorização das diferenças, que não são vistas como um fator de divisão mas sim como fonte de múltiplos pontos de vista e ideias novas. Não é com quem já pensa como nós que mais aprendemos, mas sim com aqueles que são diferentes. Aumentar a diversidade e estimular a exposição à diferença passa por várias mudanças. Desde logo, no recrutamento, onde é imperioso contrariar a tendência para escolhermos os candidatos que são mais parecidos connosco. O mesmo em relação às promoções, onde mais uma vez volta a sentir-se esta preferência pelos que se nos assemelham (e que quando os decisores são quase todos homens tende obviamente a deixar para trás as mulheres). Depois, há que rebentar com os silos funcionais e pôr a trabalhar em conjunto trabalhadores de várias especialidades: a produção com a contabilidade, aa vendas com o IT, todos uns com os outros. E por fim, é preciso abrir a organização ao exterior, sem medo de “contaminações”, para aprender com os clientes, com os fornecedores, com os antigos trabalhadores, e até mesmo com os concorrentes. Há que identificar e emular as causas da superioridade das organizações líderes ou pioneiras, em vez de nos limitarmos a invejá-las. Há que incentivar os trabalhadores a envolver-se em associações profissionais e também no voluntariado, para arejar a organização e deixar entrar informação e ideias por todos os seus poros. Não nos iludamos, alguma informação sairá também, mas o essencial é que o balanço seja claramente positivo e que se adotem precauções para que essa informação não seja crítica.

Estas condições podem ser promovidas e reforçadas por processos e hábitos concretos, que compete naturalmente aos líderes instituir. Um deles é o debate regular para rever em equipa os incidentes que a afetaram sem ver nisto uma perda de tempo mas sim um momento de aprendizagem. No “lean manufacturing”, por exemplo, todas as falhas ou incidentes desencadeiam sempre uma reunião para identificar e eliminar as “causas raiz”, e também aqui a diversidade – participam operários, engenheiros, técnicos de qualidade… – é um fator essencial.

Um outro, também já aqui falado em várias ocasiões, é a substituição da “avaliação desempenho” tradicional por conversas regulares do líder com cada um dos seus colaboradores, para rever dificuldades, reconhecer aprendizagens, acordar objetivos de desenvolvimento, puxar pelos pontos fortes de cada um.
Muito mais haveria para dizer, mas infelizmente o espaço disponível não me permite continuar. Mesmo assim, já estamos muito para além das 40 horas de formação por ano e por trabalhador…

João Paulo Feijoo

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