Com a diversificação dos negócios assente nas novas formas de consumo e no multichannel, o atendimento ao cliente tem vindo a assumir novos contornos no mundo da logística. O crescimento das compras online e a consequente gestão de encomendas requer um serviço de acompanhamento de qualidade e eficaz, de forma a ir ao encontro das expetativas de um cliente mais exigente e garantir uma experiência de compra excecional. Para um serviço mais rápido e eficiente, as empresas investem cada vez mais em soluções tecnológicas, onde os bots e a Inteligência Artificial (IA) vão complementando a intervenção humana nos centros de atendimento. À revista Logística Moderna, Gianluca Pereyra, Diretor da APCC (Associação Portuguesa de Contacts Centers) falou da implementação da IA no customer service, as oportunidades e os desafios.
Logística Moderna – A IA já é uma realidade na área do Customer Service?
Gianluca Pereyra – Sem dúvida. A IA já faz parte integrante do setor de contact centers e do atendimento ao cliente. De acordo com os estudos anuais de Caracterização e Benchmarking da APCC, o uso de IA nas operações tem crescido significativamente nos últimos anos, refletindo o avanço da automação em áreas como suporte ao cliente e análise de dados. A IA está cada vez mais sólida na sua implementação em tarefas como atendimento automático e o suporte ao agente em tempo real. O nosso setor continua a explorar novas formas de otimizar a eficiência operacional e melhorar a experiência dos clientes.
Quais são as vantagens desta tecnologia em termos de eficiência no atendimento ao cliente?
A IA permite a automatização de tarefas mais frequentes, tais como as respostas às “FAQs”, consulta de dados, resolução de solicitações mais simples, libertando assim os agentes para se concentrarem em interações mais complexas. Isto resulta num aumento da produtividade dos colaboradores e numa redução significativa do tempo de resposta ao cliente. Em 2023, 14% dos atendimentos foram realizados por bots e 34% das solicitações foram resolvidas através de IA, o que contribui para um serviço mais ágil e eficiente. O decréscimo nestes valores percentuais (quando comparado com o ano anterior), evidencia alguns desafios na utilização desta tecnologia. Contudo, o aumento de investimento em IA por parte das empresas demonstra a confiança que existe no setor em que a IA ajuda a aumentar a eficiência e a produtividade nas operações.
Quais são os maiores desafios?
Apesar dos benefícios claros, a implementação da IA não está isenta de desafios. Um dos principais é a integração eficaz desta tecnologia com os sistemas já existentes. Além disso, é fundamental encontrar um equilíbrio entre o uso de IA e o toque humano, garantindo que o atendimento ao cliente não perca a sua empatia, essencial para a resolução de questões mais delicadas.
Este tema foi explorado na conferência da APCC em outubro, cujo tema foi a “Inteligência Artificial e Emoção Humana: Um Diálogo Necessário”. Outro desafio relevante é a capacitação dos colaboradores para utilizarem esta tecnologia de forma eficiente, além da crescente necessidade de garantir a proteção de dados sensíveis, à medida que o volume de informações aumenta.
A IA é uma solução apenas para serviços simples e rápidos ou também pode ser aplicada a operações mais complexas?
Inicialmente, a IA foi aplicada principalmente a tarefas simples e repetitivas, como chats automatizados e FAQs. No entanto, os avanços recentes permitiram o seu uso em operações mais complexas, como a análise de sentimentos em tempo real, a triagem de chamadas e até mesmo no apoio direto aos agentes. O nosso estudo indica que muitas operações já utilizam IA não apenas para automação básica, mas também em processos mais avançados, como personalização de interações e análise preditiva. Atualmente, 50% das operações investem em IA, um número significativamente maior em comparação com 2022.
A IA vem substituir ou complementar o trabalho humano?
Na visão da APCC, a IA complementa, em vez de substituir, o trabalho humano. Embora a IA seja eficiente em diversas tarefas, ainda não consegue replicar a empatia e a inteligência emocional dos agentes. Acreditamos que o futuro do atendimento ao cliente passa pela colaboração entre a tecnologia e as pessoas. A IA assume as tarefas repetitivas e rotineiras, enquanto os agentes humanos se dedicam à resolução de problemas mais complexos e à gestão de situações que exigem uma abordagem mais pessoal. Atualmente, 57% das chamadas tratadas por IA acabam por ser transferidas para um operador humano, o que reforça o papel fundamental dos agentes na criação de uma experiência de cliente de alta qualidade.
Do ponto de vista do cliente, qual é o nível de satisfação com um atendimento cada vez mais tecnológico?
A satisfação do cliente depende, sobretudo, da eficácia com que a sua solicitação é resolvida e do momento em que a avaliação é realizada. Em 2023, apenas 56% das operações realizaram inquéritos de satisfação, com um aumento na classificação média para 83%. Com o crescente investimento em tecnologia e a melhoria na satisfação do cliente, podemos afirmar que há uma tipologia de clientes que se sente bastante satisfeita com o self-care e com o uso de IA para resolver as suas questões.
Como vê o contact center do futuro?
Visualizamos os contact centers do futuro como ambientes híbridos, onde humanos e IA trabalham em sinergia. As operações estarão cada vez mais automatizadas, com processos otimizados por dados em tempo real, mas os agentes humanos continuarão a ter um papel essencial nas interações mais complexas. A nossa visão para o futuro inclui maior eficiência operacional, personalização avançada e uma forte colaboração entre IA e agentes humanos. O setor de contact centers abrange uma vasta gama de intervenientes – desde os colaboradores e prestadores de serviços (BPOs), até as empresas com os seus próprios departamentos de atendimento ao cliente, empresas tecnológicas que fornecem IA e o setor regulador. A APCC foi criada precisamente para promover a colaboração entre estes intervenientes, facilitando a partilha de conhecimento e boas práticas, com o objetivo de aumentar a qualidade e a excelência do setor em Portugal.