Instalação do Cabo óptico submarino ‘EllaLink’: «Condições meteorológicas foram o maior desafio»

A presidência portuguesa do Conselho da União Europeia (UE) inaugurou ontem, em Sines, o cabo óptico submarino ‘EllaLink’, que liga a Europa à América do Sul e que será “essencial” para a interconexão digital dos continentes. A Logística Moderna dá-lhe a conhecer toda a operação logística.

Num investimento de 150 milhões de euros, esta operação proporciona um nível de conectividade internacional «sem precedentes» entre os dois continentes e que chega à Europa através de Portugal. Lembramos a conversa que a revista Logística Moderna teve com Philippe Dumont, CEO da EllaLink, no início deste ano e que nos deu a conhecer os passos desta operação.

 

Operação de instalação do cabo óptico submarino EllaLink

No Brasil o cabo parte de uma praia em Fortaleza onde já existem diversos sistemas de cabo submarino, fazendo dela um local de ancoragem adequado – para além disso, fica próxima da Estação de Instalação de Cabos Telxius, que vai acolher o equipamento da EllaLink. Foi construída uma nova e diversa abertura e uma ligação frontal curta para evitar a congestão local e pontos únicos de falha (SPOF, na sua sigla em inglês). Por outro lado, em Portugal foi necessário encontrar um novo local de ancoragem, porque os existentes (em Sesimbra, Carcavelos e Seixal) «estão severamente sobrecarregados». «A diversidade é fundamental para o design de uma rede fiável e escolhemos Sines por esta razão», diz Philippe Dumont. O conceito do “Sines Tech Hub” nasceu de uma conversa com o parceiro local da EllaLink, a Global Parques. O “Innovation and Data Center Hub” é uma localização de acesso aberto para novos sistemas de cabo submarino e infraestrutura de Data Centers em Portugal, que oferece terreno eficiente em termos de rentabilidade, redes de alta densidade de energia e uma conectividade de “backhaul” fiável. O Sines Tech terá um papel preponderante no desenvolvimento da infraestrutura internacional de telecomunicações de Portugal e na criação de ligações fundamentais entre Data Centers em toda a Península Ibérica. «A EllaLink é o cliente inaugural do hub e orgulha-se de apoiar novos incentivos às telecomunicações em Portugal.»

O sistema de cabos submarinos EllaLink consiste em quatro pares de fibra entre Fortaleza e Sines. O comprimento do tronco é de cerca de 6.000km e também existem ramificações para a Cidade da Praia (Cabo Verde) e o Funchal (Madeira). A rota directa entre Portugal e o Brasil resulta numa latência de ida e volta inferior a 60ms, menos de metade da latência dos sistemas que ligam os dois continentes através da América do Norte. Cada par de fibra tem capacidade de 18Tbit/s, resultando numa capacidade geral do sistema de 72Tbit/s. Tecnologias coerentes de última geração serão utilizadas ao longo da rede para assegurar uma transmissão de alta velocidade harmoniosa. «Sabemos que o tempo de operacionalidade é crucial para os utilizadores de internet de hoje e garantimos que a rede EllaLink conta com diversidade integrada – desde a nossa rota de cabos submarinos às nossas rotas terrestres, passando pela construção de pontos de entrada e a ligação física de cabos dentro de Data Centers», refere o responsável.

 

Ramificações para a Madeira e Cabo Verde

O sistema foi concebido com ramificações para a Madeira e Cabo Verde. Estas ligações são realizadas a partir de Unidades de Ramificação instaladas no tronco do cabo principal entre Portugal e o Brasil e permitem que as ilhas se liguem a ambas as extremidades do sistema. O sistema de cabos também foi projectado para acomodar futuras extensões submarinas às Ilhas Canárias, Marrocos, Mauritânia, Guiana Francesa e sul do Brasil.

A rota de “backhaul”, como é conhecida, é a ligação da Estação de Ancoragem de Cabos em Sines aos PoPs e Data Centers em Lisboa, Madrid e Marselha. O Sines Tech Hub consegue oferecer conectividade directa e diversa entre a estação e os principais locais de PoP e Data Center. Do ponto de vista terrestre, estão disponíveis várias rotas de #backhaul” para Lisboa e Madrid, que são fisicamente diversas de forma a criar um anel seguro entre a estação e os Data Centers. Os mais protegidos passam por tubos de gás e linhas de alta tensão. Ambas as rotas terrestres foram projectadas para criar uma infraestrutura de fibra de alta disponibilidade que já foi tecnicamente qualificada. É possível a integração com o sistema de cabos submarinos para garantir conectividade perfeita e instalar equipamentos de transmissão directamente no Data Center.

Como curiosidade, de salientar que a ramificação para a Madeira também contém uma fibra adicional, exclusivamente para a monitorização das condições do fundo marinho. Sismologia, vulcanologia, ecologia marinha e condições oceânicas são fundamentais para compreender o futuro do planeta. Assim, a EllaLink e o seu parceiro EMACOM, com o apoio das redes académicas de Géant, estabeleceram o EllaLink GeoLab, uma iniciativa que visa fornecer à comunidade científica dados em tempo real, precisos e relevantes, sobre as condições do fundo do mar ao longo da rota do cabo. A EllaLink é o primeiro cabo submarino de telecomunicações comercial do mundo a integrar conceitos de cabo SMART no seu design.

 

Condições meteorológicas são o maior desafio

Para realizar a operação de actividades de instalação marítima foram necessários dois navios – o Île de Brehat levou o cabo às águas brasileiras e o Île de Sein está a instalar o resto do sistema. Até à data, o Île de Sein completou as ancoragens em Sines e no Funchal e em seguida fá-lo-á em Cabo Verde. Para além disto, duas outras embarcações têm estado a realizar a inspecção pós-ancoragem e as actividades de enterramento dos cabos para «garantir a máxima protecção do sistema».
Todo o cabo foi colocado nas duas embarcações a partir das instalações de fabrico em Calais, França. O Île de Brehat carregou cerca de um terço do sistema de cabos e o Île de Sein os restantes dois terços. O comprimento do cabo e também o seu tipo de couraça protectora determinam a duração deste carregamento e, para além destes pontos, a velocidade de instalação depende também de o cabo ser colocado à superfície ou enterrado (como é o caso).

O Île de Brehat levou cerca de duas semanas a carregar um terço do cabo, incluindo o tempo de rigging, testes e de-rigging. O Île de Sein carregou os restantes dois terços num mês. As operações marítimas vão levar cerca de dois meses e meio, com ambas as embarcações a trabalhar em paralelo durante cerca de metade deste tempo.

Sobre as dificuldades técnicas desta operação, o CEO adianta que: «Há muitos desafios no design e instalação de um sistema de cabos submarinos, sendo o segredo antecipá-los e agendar, planear e mitigar os incidentes com tanto tempo de avanço quanto possível.» Para isso foi realizada uma análise à rota de cabos antes da instalação marítima que ajudou a equipa a desenhar um sistema de cabos robusto que tem em consideração as características do leito marinho, a existência de outros cabos, até onde é possível realizar o enterramento, que protecção de cabo é necessária e outros factores. São realizados outros estudos para determinar as melhores rotas para evitar congestão, zonas de ancoragem e áreas com muitos peixes. «Temos também especial cuidado para evitar o impacto ambiental e para ter em conta qualquer espaço de interesse arqueológico ao longo da rota. Durante as operações a equipa é responsável por garantir que o sistema é instalado de acordo com as especificações e por tomar decisões em tempo real sempre que é necessária alguma alteração. Após a chegada do cabo, há sempre considerações técnicas que são naturais durante as fases de comissionamento e aceitação do sistema, mas estas já acontecem em terra firme».

As condições meteorológicas são naturalmente o maior desafio do sucesso das operações de instalação marítima. Mau tempo pode levar a atrasos e até a paragens, mas também pode impactar o progresso se o equipamento for danificado. «É necessário também tomar precauções especiais com o enterramento, para garantir que nem o cabo, nem o equipamento são afectados por condições adversas. No sistema EllaLink, o processo de instalação tem sido maioritariamente contínuo, exceptuando as necessárias escalas em portos para fazer trocas entre a tripulação, descarregar equipamento desnecessário ou de sobra e outras atividades», explica Philippe Dumont.

Quanto à complexidade, o responsável comenta que: «É fácil focarmo-nos nas operações marítimas em termos de dificuldade, pois são tão complexas quanto dispendiosas, mas antes que possam sequer ser iniciadas há um longo processo de autorização tanto para executar as obras, como também para permitir que o cabo resida no fundo do mar ao longo do tempo de vida do sistema. Existem também os desafios logísticos «óbvios em alinhar quatro locais de ancoragem e estações de cabo diferentes, de forma a estarem prontos para a instalação e comissionamento dos equipamentos ao mesmo tempo». Na EllaLink, temos a sorte de contar com uma equipa multinacional localizada em ambos os continentes, que trabalhou harmoniosamente em conjunto, e também com os nossos parceiros locais em cada ponto. Cada projecto tem os seus próprios desafios, mas com profissionais experientes no comando, a EllaLink navegou perfeitamente, tanto em mares agitados como em águas abertas.»

A operação de carregamento de um sistema de cabos submarinos «não só é de trabalho intensivo, como requer pessoal qualificado na fábrica, na linha de carregamento e na própria embarcação», salienta o CEO. Estivadores e carregadores estão posicionados no navio para garantir o enrolamento preciso do cabo nos depósitos e o armazenamento dos repetidores nas suas pilhas. Diversos outros trabalhadores especializados são envolvidos no processo de carregamento e a operação é supervisionada pelo “Load Master”. «Só na embarcação Île de Bréhat tivemos cerca de 55 pessoas, incluindo representantes da EllaLink. Os trabalhadores de fábrica ficam em Calais, mas a restante tripulação permanece na embarcação para os trabalhos da instalação marítima.»

Segundo Philippe Dumont: «Idealmente, um cabo submarino está totalmente operacional durante a vida útil do sistema, normalmente 25 anos. «Ocasionalmente, ocorrem falhas e podem ser por uma série de razões, como danos causados por uma âncora, uma traineira, abrasão por suspensões no fundo do mar, etc. O propósito de conceber um sistema de cabos robusto é precisamente o de minimizar a probabilidade de falhas, é este o motivo pelo qual são dispensados o maior cuidado e atenção durante as actividades de instalação e enterramento.» Em caso de falha marítima, uma embarcação de reparo será enviada para o local da falha para trazer o cabo a bordo a fim de identificar a falha, repará-la e devolvê-lo ao fundo do mar. Os sistemas de cabos submarinos participam em acordos de manutenção marítima que facilitam a disponibilidade de embarcações especializadas de reparação em regiões específicas do mundo.

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